quinta-feira, 26 de março de 2009

Por prudência, para evitar a demência, deixei a imaginação presa por cordas ao chão. Busquei trabalho, cansaços, distração, sexo. Busquei na arte, o olvido e o nexo. Ouvi de Bach prelúdios, fugas e tocatas, li livros como ninguém, toquei Mazurcas de Chopin, soturnos noturnos, e de Mozart, todas as sonatas, e ainda, algumas de Beethoven, aquelas que, até os surdos, ouvem, buscando cobrir a emoção com mais emoção. Tudo em vão. Li, da caixa de correio, a carta que não veio. Colhi na roseira do quintal a rosa que nunca floriu. Colhi também, o silêncio ao telefone, a nostalgia das horas do dia, a correspondência sem a sua caligrafia, a memória que não se esgota, e a lágrima que nos olhos brota. Colhi a poesia plena de agonia, e também a morte como se fosse seu alfange e corte. Na mente, apenas a lembrança recorrente. A louca insurgência das idéias, sob um comando rebelde unificado. O assalto sem trégua do passado, os detalhes, os momentos de maior significado, tudo a que estivesse ligado a quem me ignora, à rosa que na mente mora, imaterial, idéia pura, perfumada sepultura, que a alma, dispersa em disperso ideal, nunca esquece, e com o seu pranto, sem descanso, umedece. Rosa presente em tudo o que penso, musa difusa entre espinhos florida, flor do bem e do mal, vida da minha vida, de mim perdida num impossível roseiral.
Não sei se poemas eu fiz ou se poemas me fizeram. Houve um tempo em que os gerava como quem desfolha flores ao vento. Hoje eles surgem como um vento sem flores que sopra em minha alma ressequida. Já não faço versos. Os versos é que me fazem. Escrevo, e enquanto escrevo a arte fica me olhando por sobre os óculos como uma velha que espera sentada à roca da vida, sempre a fiar, ... e a fiar... às vezes, cansada de mim, faz tricô com os ponteiros do relógio, puxando um fio do tempo de um novelo a seus pés, um emaranhado de memórias em que, numa ponta perdida, um menino galopa um corcel de sonhos.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Beijarei a tua lembrança até tu voltares. Beijarei como a uma saudade sofrida, um tédio dolorido desta vida no desterro de minha alma dolente. Beijarei tua imagem como um demente que preludiou, na tua vinda, a servidão que nunca finda, que perfura a alma e em vez de morte, mais vida lhe dá ainda. Quando tu voltares deporei nos teus lábios de caminheira, o beijo que te não dei a vida inteira. Serás a primavera dos sonhos meus, como o retorno babilônicos dos judeus, o vício satisfeito que em minha alma mora, do beijo doença, que, matando, revigora. Quando tu voltares, verás o anjo que aliena, o último suspiro, na convulsiva estrofe ao fim do meu poema. E aos teus pés deporei o meu desejo, como um beijo, num penar tão doce, como se, penar não fosse. Quando tu voltares beijarei então a tua face, e te mostrarei a Lua cheia dos meus temores, e as noites mal dormidas que me destes, com os suspiros todos que, quando o sono arrefece, como chama que inflama, ao peito desce. Beijarei, também, a beleza cristalina que mora nos teus olhos de menina, e, quando tu voltares, bem ou mal, saberás quanto te quero num beijo em agonia, que, a tanto, espero, e que, pouco a pouco, tornará real o anjo louco que, dia e noite, noite e dia, faz do teu beijo mouco, a minha fantasia.
Quer rir? Ria. Que o amor é um carcereiro De cujo cativeiro não consigo escapulir. Mas o fato É que, deste fogo em que me mato, Até o diabo quer fugir. De novo...quer rir? Pois ria que te faz bem à saúde, Que a tristeza é um ataúde Que evitei enquanto pude. Mas é que me veio à lembrança, Minha musa inda criança Com certa magia no olhar. Agora, desvanecida, Anda meio esquecida, E não quer mais me guiar. Largou-me nesta descida, Uma avenida larga e comprida, Que não sei onde vai dar...