Quem já amou
João Bosco Leal*
Milhares
de pessoas vivem casamentos de décadas pensando ou dizendo amar seu
cônjuge, o pai ou a mãe de seus filhos, mas, no fundo, quando param e
meditam um pouco mais profundamente sobre o assunto, percebem que isso
não é verdade, que estão se enganando.
São
vários os motivos que as levam a esse comportamento, mas os principais
são a acomodação e a dependência financeira, décadas atrás provocada
pelo despreparo profissional das mulheres, mas atualmente pelas
exigências consumistas cada vez maiores, impostas pela sociedade em que
vivemos, onde se gasta sempre mais do que se ganha.
As
paixões iniciais já não existem, mas surgiram laços como os
patrimoniais, sociais e os filhos, que são difíceis de serem desfeitos. A
moradia conjunta, os amigos comuns e a dependência recíproca dos que
assumiram financiamentos conjuntamente, são algumas das centenas de
alegações que, normalmente, dizem dificultar bastante um rompimento.
As
pessoas nessa situação vivem fugindo da realidade, se escondendo da
vida real, pois não querem enfrentar os problemas. Fingem acreditar que
tudo mudará, mesmo que, no fundo, saibam que isso não é verdade, nunca
ocorrerá.
Um
relacionamento conjugal não sobreviverá se estiver apoiado em
interesses materiais. Ele precisa ser muito mais profundo, estar
fundamentado em amizade, carinho, companheirismo dedicação e projetos
comuns, mas se não estiver assim lastreado, é melhor que seja desfeito,
pois jamais proporcionará a felicidade conjunta.
Entretanto,
quando o amor é verdadeiro, qualquer pensamento a respeito de um
possível rompimento é inimaginável, apesar de poder ocorrer quando, por
exemplo, um dos lados se defronta com alguma situação que o desagrada
bastante e, repentinamente, sem muito pensar, diz que tudo está acabado.
Na
realidade não era o que queria que ocorresse, mas certamente pensava
que, assim dizendo, mostraria que realmente estava realmente
insatisfeito com a situação e, então, mesmo em um casal que se ama
muito, se naquele mesmo momento, por algum motivo, o outro também está
insatisfeito com o relacionamento ou em uma situação de grande tensão,
pode ocorrer um rompimento que segundos antes era inimaginável para os
dois.
Quando isso ocorre, inconscientemente, eles passam a ter um comportamento muito comum nos seres humanos, que é o de "medir forças". Nenhum dos dois cede, reconhece o erro ou pede desculpas, o que dificulta bastante o retorno ao status quo e eles realmente acabam se separando.
Passado
algum tempo, já sem as tensões daquele momento e refletindo mais
profundamente, se o amor realmente era verdadeiro, é comum vermos uma
das partes transpor as mais difíceis barreiras - até mesmo superando seu
orgulho próprio - e procurar, se desculpar, justificar, fazendo de tudo
em busca de sua reconquista, de uma nova chance.
Essa
sempre foi e será a opção daqueles que já amaram verdadeiramente,
porque a experiência de um amor verdadeiro é indescritível e quem já o
viveu não se conforma mais em viver sem ele, sentindo, constantemente,
sua saudade transbordar do coração e, em forma de lágrimas, escorrer
pelos olhos.
Como dizia o poeta Vinícius de Morais:
"Quem já passou por esta vida e não viveu, pode ser mais, mas sabe
menos do que eu, porque a vida só se dá pra quem se deu, pra quem amou,
pra quem chorou, pra quem sofreu, ai. Quem nunca curtiu uma paixão,
nunca vai ter nada, não".
Quem já amou, mesmo que com os pés cansados, sempre dará um novo passo em busca de reviver algo igual.
*Jornalista, escritor e empresário
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